Aos 23 anos, com apenas alguns anos de carreira no surfe profissional, Becca Speak foi patrocinada por marcas como Billabong, participando de competições e se apresentando em grande estilo. Ela estava aproveitando a vida e tinha muita expectativa.
Mas em um instante, diz ela, o esporte que deu tanto sentido à sua vida “me tirou tanto” quando ela sofreu um grave ferimento na cabeça durante uma competição de surfe e ficou incapaz de falar.
“Assim que bati com a cabeça, fiquei paralisada por um momento”, disse Speak à CNN sobre o acidente, que ocorreu em uma piscina de ondas feita de concreto.
“Eu realmente não sabia o que estava acontecendo. Eu simplesmente sabia que não conseguia mover meu corpo, e me lembro de estar debaixo d’água, tipo, apenas chorando, ‘por favor, por favor, por favor’… não tinha certeza do que estava acontecendo, mas eu simplesmente sabia que não conseguia me mover, e foi realmente assustador”- Becca Speak, surfista.
Como Speak perdeu a fala?
Arrastada para fora da água por amigos que a assistiam competir, Speak não tinha certeza se algo estava seriamente errado, mas foi ao hospital porque o ferimento causou um sangramento. No caminho, ela começou a sentir atrasos na fala.
“Parecia que a conexão do meu cérebro com a boca não existia”, acrescenta ela, que voltou para casa depois que exames do hospital mostraram que “tudo parecia bem estruturalmente”.
Mas ao longo dos dias, diz Speak, ela se sentiu um pouco pior.
“Eventualmente, senti como se estivesse caindo em estado vegetativo, quase. Eu mal conseguia juntar algumas palavras. Fiquei muito estimulada pelas menores coisas, apenas pelo som de alguém falando ou pela luz do meu telefone ou de fora. Tudo era realmente demais.”
História que virou filme
Depois de uma segunda ida ao hospital, os médicos confirmaram que Speak sofreu um traumatismo cranioencefálico, o sexto após uma vida inteira praticando esportes, incluindo ginástica, esqui, snowboard, skate e natação.
O que se seguiu foi uma recuperação cansativa que durou meses, consistindo em terapia física e cognitiva, uma jornada que é narrada no novo filme “Beyond Normal”.
A surfista levou cerca de três meses para recuperar seus padrões normais de fala e mais tempo ainda antes de se sentir bem física e mentalmente novamente, graças a tratamentos neurológicos, oxigenoterapia hiperbárica e estimulação magnética transcraniana, além de reabilitação física.
“Na maioria das vezes, as pessoas dizem: ‘Oh, você está bem. Supere isso’, porque lesões cerebrais são lesões invisíveis que eles realmente não podem ver ou ninguém pode ver o que está acontecendo, você sabe, por dentro, porque você parece bem por fora”, explica Speak.
Uma jornada para toda a vida
“Acho que essa é uma história de retorno que talvez já tenha sido contada algumas vezes antes, mas acho que uma das partes únicas da história de Becca é como ela explorou todas essas novas tecnologias em evolução que existem e que não existiam cinco, 10 anos atrás”, disse a diretora e cineasta Jordyn Romero à CNN.
Romero tem sua própria experiência com ferimentos na cabeça, depois de sofrer um traumatismo cranioencefálico no snowboard enquanto estava no ensino médio. “Não me lembro de uma semana inteira da minha vida. Foi uma lesão cerebral muito grave”, disse ela.
No entanto, ela voltou aos treinos apenas uma semana depois, pensando que estava curada — e ainda hoje sente alguns dos efeitos.
Parece menos real que um tornozelo quebrado
Romero e a codiretora, Anna Wilder Burns, queriam usar a história de Speak para aumentar a conscientização sobre o impacto das lesões cerebrais.
Burns, que foi uma ginasta que virou mergulhadora na faculdade, diz que sua compreensão das concussões como atleta enquanto crescia era semelhante à de muitos treinadores, ou seja: você não pode ver, então não parece tão real quanto algo como um tornozelo quebrado.
“Tive um companheiro de equipe que teve uma recuperação de concussão muito longa e me lembro de ficar meio confusa, tipo, ‘por que está demorando tanto? É uma concussão’”, acrescenta Burns.
O que é uma concussão?
Uma concussão ocorre após uma “colisão, pancada ou sacudida na cabeça” ou “uma pancada no corpo que faz com que a cabeça e o cérebro se movam rapidamente para frente e para trás”, de acordo com a orientação dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA.
Qualquer um desses movimentos repentinos pode fazer com que “o cérebro salte ou gire no crânio”, “mudanças químicas no cérebro” e/ou “alongamento e danos” às células cerebrais, diz o CDC.
Essas alterações podem levar a sintomas, como tonturas ou desorientação no momento, ou problemas duradouros de sono, memória, aprendizagem e até alterações de personalidade.
Além disso, os especialistas alertam que impactos subconcussivos na cabeça — golpes repetitivos na cabeça e no corpo que não causam sintomas — ainda podem resultar em doenças neurológicas de longo prazo.
Filme “íntimo e vulnerável”
As cineastas consideram um relacionamento próximo e de confiança com Speak a chave para permitir fazer um filme “íntimo e vulnerável” sobre sua recuperação, que levou mais de dois anos para ser filmado.
Ao longo de seu tratamento, Speak percebeu que conviveu com os efeitos de seus ferimentos na cabeça não tratados durante a maior parte de sua vida adulta. Ao tentar voltar ao “normal”, diz ela, percebeu que nem sabia o que isso significaria, dado o efeito dos ferimentos anteriores.
“Um dia, um médico disse: ‘você tem que ir além do que você acha que é normal’. E isso se tornou uma espécie de mantra para mim durante toda a jornada de cura”, explica ela. “Essa será uma espécie de jornada para toda a vida para mim, eu acho, e eu aceitei isso e estou bem com isso”- Becca Speak
Como ficou a relação de Speak com o surfe?
A surfista diz que encontrou uma forma de mergulhar mais uma vez no surfe, esporte pelo qual “se apaixonou” porque “era muito livre: é só você e a Mãe Natureza”.
O acidente dela quase mudou isso, disse ele, admitindo que durante um ano, “eu não sabia se algum dia queria surfar novamente”. “Eu tinha muito ressentimento em relação ao surfe, porque isso me tirou muito”.
No entanto, ela finalmente começou a pensar que poderia tentar novamente — mesmo que fosse assustador. Speak voltou a surfar novamente todos os dias, mas agora usa um capacete de espuma.
“É como o próximo capítulo da minha vida, e meus objetivos são maiores do que nunca. Alguns dias ainda são mais difíceis do que outros, e estou tentando encontrar o equilíbrio entre me esforçar, mas também reservar um tempo para descansar e me recuperar para poder realizar todas as coisas que quero fazer”, acrescenta ela.
Fonte: CNN Brasil
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